As convenções e estatutos condominiais costumam prever uma série de condutas que, quando praticadas pelos condôminos, são passíveis de multa. Uso irregular de vaga de estacionamento, colocação de lixo em local inapropriado, barulho excessivo e má-utilização de espaços coletivos (como academias e playgrounds) são apenas alguns exemplos de condutas que podem levar à imposição de multa.
Entretanto, tais convenções do condomínio e a sua aplicação, pelo síndico ou pela administradora, devem se submeter às regras do nosso diploma normativo maior: a Constituição Federal.
A Constituição prevê, em seu art. 5º, LV, que “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. Essa previsão constitucional é aplicável tanto nas relações entre os indivíduos e o Estado como nas relações entre particulares (caso das relações entre condôminos e condomínios).
Diante da previsão constitucional, que irradia efeitos em todas as relações individuais, a jurisprudência brasileira tem entendido que a multa condominial não pode ser aplicada sem que haja ao menos dois atos essenciais: a) a notificação do condômino quanto ao ato irregular que por ele foi, em tese, praticado; b) a abertura de oportunidade de se defender, apresentando as suas versões e as possíveis provas (como testemunhas, documentos e filmagens). Sem que haja, portanto, direito ao contraditório (que, em linhas gerais, consiste em contradizer a versão do condomínio) e à ampla defesa (direito de produzir provas que afastem o reconhecimento da irregularidade da conduta), nenhuma multa pode ser imposta e, caso haja a imposição sem observância de contraditório e ampla defesa, deve a multa ser anulada.
Vejamos, nesse sentido, como tem se posicionado o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo: “Ação anulatória de multa condominial cumulada com pedido de restituição de valores – imposição de multa sem a oportunização de oferecimento de defesa antes da imposição da penalidade – violação ao princípio constitucional do contraditório e da ampla defesa – Sentença que julgou procedente o pedido da autora, decretando a nulidade da multa imposta e condenando o condomínio ao pagamento do valor de R$ 757,00, pago indevidamente pela autora – Recurso improvido - Recurso Inominado/Direitos/Deveres do Condômino – 5ª Turma Cível de Campinas – Registro em 03/09/2015 – Processo nº 1031939-42.2014.8.26.0114”.
Portanto, as multas aplicadas pelo condomínio não podem ser uma mera “notificação de pagamento”. Pelo contrário, deve o condomínio garantir ao condômino o direito de se manifestar e de produzir provas que afastem a aplicação da penalidade, sob pena de reconhecimento judicial da nulidade da sanção imposta. Protege-se, deste modo, a norma constitucional, que, por ser a superior no ordenamento jurídico, não pode ser violada por convenções condominiais.
Comentários
Postar um comentário